ADEUS SEU MIGUEL

Miguel Pereira Duarte foi pedreiro, homem simples, dedicado a igreja evangélica. Pobre, passou dificuldades na vida, caçou para dar o que comer aos 6 filhos e a esposa.
Fazia hora extra, bicos, seguia a vida que Deus havia lhe dado. Mesmo com tantas privações, soube como poucos viver na dignidade, educar os filhos nos preceitos de Deus, da moral e dos bons costumes.
Era um exemplo vivo de que a falta de recursos não era motivos para desonestidades, deslealdades, vida marginal, infracções de caráter. Jamais vi uma família tão coerente, tão bem guiada, tão unida.
Mas a vida resolveu testar seu Miguel, sua disposição. Dois enfartos, uma cirurgia de safena, diabetes, pressão alta, duas cirurgias de câncer na bexiga só este ano, quimioterapia, tudo isso nos últimos sete anos de sua vida.
A cada possibilidade de cura, a cada tratamento doloroso seu Miguel levantava a cabeça e encarava. Jamais, nunca, em momento algum vi este homem reclamar´. De nada.
As dores, segundo os médicos, deviam ser avassaladoras, pela dificuldade das regiões afetadas. Mesmo assim, como uma rocha, ele recebia a porrada da marreta, observava uma lasca saindo de seu corpo, mas ficava forte.
Nos últimos anos, os da doença, também foram os anos de calmaria. Nova casa, um condomínio bonito, paz, tranquilidade, só ele e sua Maria, os filhos todos encaminhados.
Um carro para levá-lo para passear de vez em quando, uma peixada vez ou outra, o silêncio das noites sem mais o barulho dos bregas.
Umas roupinhas novas, um menino para chamar de seu neto.
Seu Miguel era avô de meu pequeno professor, meu menino tão esperado. Com ele, desbravava os cantos do condomínio, com ele seu sorriso aparecia largo, seus olhos brilhavam, sua esperança na vida se renovava.
Jamais vou poder agradecer a este homem o que fez por mim. Mesmo eu sendo um forasteiro, fui recebido como um filho.
Seu Miguel era uma das pessoas que mais vibrava com as minhas vitórias, mais orgulho tinha das minhas conquistas, mais "potoca" contava por aí. Meu telespectador, meu admirador.
Mas é mesmo com meu filho que ele arrebatou meu coração. Todos sentiremos sua morte, ocorrida ontem por causa de um AVC que não lhe deu a oportunidade de combatê-lo, mas quem mais perde é o futuro de meu filho.
Sem o carinho, a paciência, a dedicação, as brincadeiras, as malandragens, as peraltices do avô.
E eu fico tendo a certeza que por melhor que eu venha a ser, por melhor que eu tente ser, jamais serei como o Seu Miguel. Jamais conseguirei ser tão grande, aparentemente com tão pouco.
Ou melhor, Seu Miguel tinha muito, o respeito de toda uma comunidade em Icoaraci que lotou uma igreja velando e chorando, a admiração dos vizinhos, dos amigos, dos pastores, dos filhos. O amor do tanta gente.
Ele é a prova de que, mesmo sem recursos financeiros, mesmo sem instrução, mesmo sendo pedreiro e pobre um homem pode ter dignidade, ser respeitado, admirado e amado.
Obrigado seu Miguel, pelo carinho comigo, pelo amor a meu filho, ao nosso filho. E mais, obrigado meu Deus por ter tido a honra de conhecer e viver com alguém tão especial, tão forte, tão doce, tão cheio de dignidade, tão crente em seus ensinamentos Senhor.
Foi, verdadeiramente, uma alegria poder estar perto de tí, meu sogro-pai.
Um beijo e fique com Deus.